Golbol: um esporte paralímpico que garante medalhas e transforma vidas
- Isabelle Giroldo e Maria Clara Ribeiro
- 25 de jul. de 2016
- 5 min de leitura
O Rio de Janeiro será o palco do mais importante evento esportivo do planeta. Se pensou somente nas Olimpíadas, se enganou. A Paralimpíada, que começa logo depois, também irá reunir a elite de diversos esportes voltados para deficientes físicos. Mais de 4 mil atletas competem na primeira edição dos Jogos Paralímpicos da América do Sul. A disputa pelas vagas, iniciada em 2014, está em andamento e será finalizada pouco antes do início dos Jogos, quando será confirmada a lista oficial de atletas. Serão 23 modalidades em 11 dias de competição 528 provas valerão medalhas: 225 femininas, 265 masculinas e 38 mistas. Alguns esportes que estarão presentes são o atletismo, o basquetebol em cadeira de rodas, bocha, canoagem, ciclismo, halterofilismo, hipismo, judô, natação.
Entre eles uma modalidade pouco conhecida: O Golbol. Criado após a 2º Guerra Mundial o Golbol é destinado para pessoas com deficiência visual como uma forma de reabilitação paras os soldados que perderam a visão no conflito. “É o único esporte que foi criado exclusivamente para pessoas com deficiência. Os outros esportes “vieram do convencional e foram adaptados para pessoas com deficiência como o futebol, o atletismo, vela, tênis com cadeira de rodas”, garante o Professor de Educação Física e técnico Márcio Rafael. O golbol foi incorporado aos jogos paralímpicos em 1976 e “de lá para cá vem só evoluindo e crescendo”.
Tanto o golbol como o futebol de cinco possuem uma bola que faz barulho. Na verdade qualquer esporte para deficientes visuais que precise de uma bola, ela deve fazer barulho, pois é a referência auditiva que permite ao atleta localizar a bola. O futebol de cinco é o futebol normal formado por cincos jogadores com quatro atletas na linha em pé, que são cegos totais, no máximo, “possuem uma percepção de luz, mas não conseguem reconhecer nenhuma forma” e o goleiro, que enxerga. O golbol, em contrapartida, é formado por três jogadores e envolve três classes visuais, sendo os jogadores divididos em três categorias conforme o grau de deficiência: B1 – cegos totais que não enxergam nada, B2 e B3 deficientes que possuem uma baixa visão. “Eles têm uma percepção visual, alguns enxergam a uma certa distância mas têm uma patologia que não permite que óculos ou outro recurso melhore a visão deles”, lembra Márcio. Os três jogam juntos na mesma modalidade usando óculos negros para igualar a visão de todos. Os três são defensores e atacantes ao mesmo tempo. Um time faz um lançamento com a bola próxima ao solo, dessa forma ela irá rodar e fazer um som. O time contrário irá tentar defender essa bola deitando no chão. A partir desse momento a equipe que antes estava atacando, agora irá se posicionar para defender a bola. Assim que se tem posse de bola, a equipe possui dez segundos para atacar o time contrário. “É um pouco da dinâmica do vôlei, já que não há invasão territorial e não há contato físico”.
O trabalho de Márcio Rafael começou há dez anos. Ele é professor do Estado, formado em Educação Física, e foi cedido para trabalhar no Instituto Roberto Miranda, chamado anteriormente ILITC – Instituto Londrinense de Instrução e Trabalho para Cegos, localizado na Rua Netuno, 90 no Jardim do Sol, que atende deficientes visuais, visando sua integração na comunidade. Ele treina a seleção de golbol de Londrina e as vezes é chamado para auxiliar a seleção nacional. Em 2007 ele criou o projeto de golbol, “meio que por acaso”. Durante uma competição de atletismo em Curitiba, competiu com alguns atletas. Depois foi indagado se possuía um time de golbol para representar o estado nas paralimpíadas escolares em Brasília. “Eu falei que tinha, mas eu não tinha o time de golbol e eu nem sabia o que era o golbol.” Após uma pesquisa, com poucos recursos, ele chegou para treinar os atletas “mas percebi que era bem diferente do que imaginava, mas nós tivemos cursos com técnicos da seleção e de lá para cá comecei a estudar e pesquisar e montamos uma equipe que está competindo no cenário nacional faz 8 anos”.
O golbol foi por acaso, mas desde que começou a estudar Educação Física sua meta era o esporte, “não para pessoa com deficiência, mas o esporte em geral. Hoje trabalhando aqui há dez anos, eu consegui conciliar duas coisas que eu gosto muito: que é o esporte e o trabalho com pessoas com deficiência, então eu consigo fazer um trabalho social - que é a parte da deficiência, que é você reabilitar a pessoa, poder dar melhores condições de vida para ela - e também consigo trabalhar o esporte de alto rendimento que é a parte de fisiologia, parte de treinamento físico, técnico, táctico e competitivo em alto nível”.
Ele também possui experiências em outras áreas. Já trabalhou na APAE com deficientes intelectuais e físicos, na APS-DOWN com pessoas com síndrome de down e hoje ele faz mestrado na área de Educação Física adaptada para trabalhar com o golbol, estudando alguns aspectos da qualidade de vida desses atletas que competem em alto rendimento.
O time de golbol começou em 2007 com o infantil e em 2008 com os adultos. O time possui alguns títulos importantes nesse período de oito anos: eles são tricampeões brasileiros da região sul e desde 2010 estão entre os dois primeiros colocados da região. No Paraná a equipe é tricampeã nos Jogos Paradesportivos Paranaenses. Eles possuem mais ou menos 10 atletas na equipe que treinam durante a semana à tarde e aos sábados no período da manhã, sendo esse último, um treino mais completo e mais elaborado.
Atualmente eles não possuem nenhum atleta na seleção, mas em 2011, uma menina foi convocada para a seleção e disputou o Parapan de Guadalajara no México ficando em segundo lugar e em 2012 ela saiu da equipe – porque recebeu uma proposta de uma equipe de São Paulo- ela também foi disputar os Jogos Paralímpicos de Londres e vai disputar as Paralimpíadas agora em 2016.
A equipe brasileira masculina, atualmente é a melhor do mundo, sendo a Campeã mundial e a vice-campeã paraolímpica e a “grande seleção a ser batida nas paraolimpíadas do Rio”, desafia Márcio.
Sobre levar a tocha olímpica quando passou por Londrina, Márcio se sentiu orgulhoso: “Eu levei a tocha por causa do meu trabalho. Foi uma coisa fantástica, você fazer parte da história, do momento, mesmo que seja por um pouco espaço de tempo, você poder carregar o fogo olímpico que é o símbolo dos jogos, a representação máxima dos jogos, foi muito emocionante, foi muito legal. Eu to indo em escolas, levar a tocha para as crianças verem, para tirarem dúvidas... Foi uma coisa muito importante na minha vida como profissional e como pessoa também”.
Mas o maior orgulho desse professor é mesmo pode dedicar sua profissão a ajudar quem mais precisa. “Trabalhar com pessoas com deficiência é muito legal, assim, é claro, eu recebo para isso, mas a questão financeira fica em segundo plano muitas vezes. Porque o trabalho que você faz de acolhimento, de reabilitação, de ajudar a pessoa com deficiência é muito legal. Nós temos mania de reclamar da nossa vida muitas vezes, e aí você vê a dificuldade que eles têm e mesmo assim eles estão felizes, eles estão fazendo as coisas, você fala assim: Meu, nós não temos problemas. Temos que valorizar cada momento disso”. Trabalhar com pessoas com necessidades especiais trouxe muitos ensinamentos e exemplos. Toda essa experiência Márcio garante que vai carregar para o resto da vida. “Nós temos que olhar para frente e falar que nós somos capazes e nós podemos porque eles fazem isso, então se eles podem nós podemos. E eles podem não porque são deficientes, eles podem porque são pessoas que, como nós, têm a capacidade de conquistar as coisas.”

Márcio segurando a bola usada nos jogos de golbol
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